segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Financial Times: Brasil: problema no motor

Brasil: problema no motor

O país que foi um motor da economia global é agora o homem doente dos mercados emergentes



Ponto de frenagem: Um trabalhador na linha de montagem na fábrica da MAN em Resende, 
estado do Rio de Janeiro



A sala da diretoria da fabricante de veículos pesados ​​MAN em São Paulo é decorada com uma coleção modelos em miniatura de seus caminhões, bolas de futebol e as camisas de times de futebol locais.



Mas os brinquedos não ajudam a melhorar o humor ali. Aquela que foi considerada uma campeã do mundo corporativo brasileiro, com taxas de crescimento de dois dígitos, a indústria de caminhões tem caído em tempos difíceis assim como a seleção brasileira de futebol que foi goleada pela Alemanha na Copa do Mundo do ano passado.



Nos primeiros seis meses deste ano, a produção de caminhões e ônibus caiu 45% em comparação com o ano anterior. É um desastre que deve ser repetido este ano na maior economia da América Latina.



"Na minha vida profissional, eu já passou por 17 crises [econômicas]", diz Roberto Cortes, CEO da MAN América Latina, de propriedade da Volkswagen, contando nos dedos vários episódios de tumulto financeiro, a partir de "crise tequila" no México de 1994 a Lehman Brothers, em 2008." Esta é mais uma. E é uma que é muito específica para o Brasil. "



O país deixou de ser um motor da economia mundial, no rol dos países que apresentam rápido crescimento do chamado Bric para se tornar o país doente dos grandes mercados emergentes. O desemprego está em alta, a confiança dos empresários em queda livre. A agência de classificação Standard & Poors está considerando reduzir sua classificação de grau de investimento para junk. O país está quebrando recordes negativos de todas as maneiras. "Achamos que a atual recessão vai desafiar o Brasil da pior maneira na história recente, pelo menos desde que os dados trimestrais começaram a ser recolhidos em 1996", segundo o BNP Paribas, que está prevendo uma contração do produto interno bruto este ano de 2,5 por cento, menor que 0,1% positivo do ano passado. Entre os grandes mercados emergentes, apenas a Rússia deverá ir pior que o Brasil este ano, de acordo com previsões do PIB do Fundo Monetário Internacional.



Rousseff na linha de fogo



Apenas seis meses depois do início de seu segundo mandato de quatro anos, Dilma Rousseff está sofrendo as mais baixas classificações de qualquer presidente na história democrática recente do Brasil. Pior, a economia fraca denigre as conquistas passadas de seu Partido dos Trabalhadores, ou PT, partido governante durante seus 13 anos no poder de esquerda - a criação de uma nova e vasta classe média baixa. A frágil prosperidade desse grupo está em risco - e junto com isso a permanência de Rousseff no poder.




A recessão vem enquanto os promotores estão investigando principalmente os políticos da coalizão no poder em um escândalo crescente na empresa petrolífera estatal Petrobras. Conhecida como Lava Jato, a investigação tem alimentado as chamadas para seu impeachment e está colocando não só o legado de Dilma Rousseff em risco, mas também a do PT.



"Desde o segundo turno das eleições, o governo não foi capaz de produzir uma boa notícia", diz Renato Meirelles, diretor da empresa de pesquisa de mercado Data Popular.



Os economistas dizem que há uma coisa avançando no Brasil: a de que a atual recessão é apenas isso - uma desaceleração cíclica ao invés de uma crise de grandes proporções do tipo que o país sofreu em 1980 e 1990.



O Brasil não está passando por uma crise de conta corrente ou cambial - O país tem reservas cambiais de cerca de US$ 369 bilhões, entre os maiores estoques do mundo. Como vários outros grandes mercados emergentes, o Brasil está sofrendo com o fim do super-ciclo de commodities em meio ao recuo da demanda da China, bem como o esgotamento de um boom de crédito doméstico. Mas a profundidade da crise está sendo responsabilizada por manobras de Dilma Rousseff - em seu primeiro mandato - para prolongar o período de bonança por meio de controles de preços e um programa de estímulo, em grande parte ineficazes. O Brasil registrou seu primeiro déficit fiscal primário - o saldo orçamental menos juros - em uma década, em 2014.



Sua generosidade fiscal levou a uma situação tóxica de baixo crescimento e alta inflação, forçando o Banco Central a subir a sua taxa básica de juros para 14,25 por cento na semana passada - maior do que em qualquer outra grande economia. Foi seu oitavo aumento consecutivo em 11 meses.



"Esta é mais uma recessão tradicional relacionada com o ciclo econômico do que uma daquelas crises que tivemos no passado", diz Caio Megale, economista do Itaú Unibanco. "O problema é o ciclo económico sendo intensificada pelos exageros de política do passado. . . e a Operação Lava Jato".



Para inverter a situação, Dilma Rousseff nomeou ano passado um Ministro da Fazenda combativo, da Escola de Chicago, Joaquim Levy. Ele começou com a promessa de restaurar o superávit primário, uma medida chave para a saúde das finanças públicas, em 1,2% do PIB. Ele freou empréstimos subsidiados pelos bancos estatais e cortou alguns benefícios sociais e de emprego. Mas a maioria das economias até agora vieram de corte do investimento público - algo que o Brasil com a sua infra-estrutura deficiente realmente precisa, se quiser crescer novamente.



"A questão fiscal no Brasil não é apenas um problema de dívida, mas também um problema da qualidade dos gastos", diz José Augusto Coelho Fernandes, diretor de políticas e estratégia da Confederação Nacional da Indústria.



A combinação de política fiscal e monetária mais restritiva tem intensificado a crise. O desemprego atingiu 6,9% em junho, contra 4,8% de um ano antes. O crescimento mais lento esmagou as receitas fiscais, obrigando o Sr. Levy, na semana passada a recuar em metas do governo para o superávit fiscal primário. Ele cortou-a para apenas 0,15% do PIB em 2015 e reduziu-a nos próximos anos para níveis abaixo do que os economistas acreditam que são necessárias para estabilizar a dívida pública.



A agência Standard & Poor's respondeu ao reduzir as perspectivas de classificação de grau de investimento do Brasil, que está um nível acima de junk, para negativo. As outras agências, Moody e Fitch, deverão reduzir as suas avaliações, se não houver melhora no clima econômico e político.



"Isso pode mover a agulha que faltava nas agências de classificação em termos de re-avaliar o merecimento de crédito soberano em 2016 e 2017, porque a dinâmica da dívida não está melhorando", diz Alberto Ramos, economista da Goldman Sachs.



Iniciativa privada versus Governo



Ramos argumenta que o Brasil precisará aprofundar sua reforma fiscal para cortar despesas do estado que no ano passado gastou 42% do PIB - um montante comparável com os países desenvolvidos. O argumento é que somente com um Estado mais eficiente o Brasil vai ser capaz de aumentar a produtividade, retomar o crescimento econômico e competir globalmente.





No modelo econômico estatista do Brasil, o manobrar do governo muitas vezes significa também prejudicar os negócios, de tão interligados que ambos são. Cortes da MAN diz que a indústria não está apenas sofrendo de uma economia fraca, está sendo ferida pelo programa de austeridade do governo. Cortes de infra-estrutura têm reduzido a necessidade de veículos pesados ​​na economia, mas o governo também reduziu suas próprias compras de equipamentos, de caminhões do exército de ônibus escolares.



O governo também dificultou os termos de um programa de incentivo no qual foram oferecidos aos compradores de caminhões empréstimos subsidiados. "Por isso, é agora mais difícil justificar o investimento em novos caminhões", diz Cortes. A empresa lançou um programa de demissão voluntária e demissões temporárias.



Em outro país, a indústria automobilística pode ser capaz de tirar proveito de uma profunda desvalorização da moeda - o Real do Brasil atingiu a menor cotação em 12 anos em relação ao dólar - através do reforço das exportações. Mas a interferência do Estado na indústria de caminhões exigindo altos níveis de conteúdo produzido localmente minou a sua competitividade. Para se qualificar para financiamento subsidiado, por exemplo, fabricantes de caminhões do Brasil devem incorporar conteúdo local de até 60% em seus veículos medidos tanto em termos de valor e quanto em peso, os produtores dizem.



Armadilha da classe média



A crise está prejudicando as oportunidades de emprego para os jovens que abandonam a escola e universidade, em particular, e ameaçando conduzir a nova classe média-baixa, que surgiu durante o governo do PT, de volta à pobreza, dizem os economistas. Agostinho Pascalicchio, economista da Universidade Presbiteriana Mackenzie, diz que uma pesquisa mostra que 65% das pessoas com idade entre 16 a 24 querem sair do Brasil para os países desenvolvidos bate com sua própria experiência.



Fabio Mauricio, um engenheiro civil de 24 anos de idade, saiu à procura de trabalho desde sua graduação há um ano atrás, mas um congelamento na construção civil tem tornado  impossível encontrar um trabalho. Mesmo seus colegas que trabalham como estagiários estão sendo demitidos.



Mauricio acredita que o PT da presidente Dilma Rousseff se acomodou muito depois de mais de 12 anos no poder. No entanto, a oposição PSDB, um partido centrista que é visto como mais pró-negócios, não é muito melhor, diz ele. "Ambos os lados estão envolvidos em corrupção, então não há para onde fugir."



Enquanto tais sentimentos refletem o crescente descontentamento não apenas com Dilma, mas com a classe política, dizem os analistas, a presidente é a única na berlinda, com 63% da população apoiando as chamadas para seu impeachment, de acordo com uma pesquisa feita pelo CNT / MDA divulgado na semana passada.





Ela enfrentou protestos de rua em massa no início deste ano e estão planejados mais deles para o final deste mês. Os promotores da Operação Lava Jato, em que ex-executivos da Petrobras são acusados ​​de colaborar com os empreiteiros a pagar subornos a políticos, estão lentamente minando sua coalizão de governo. Mesmo seu mentor, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, está enfrentando uma investigação criminal. Com cada avanço das investigações, o impasse político em Brasília aprofunda com seus aliados pressionando-a a fazer alguma coisa para protegê-los. 



Enquanto os analistas acreditam que um impeachment permanece improvável, os seus parceiros de coalizão preferem deixá-la tomar a culpa pela má economia pobre e as conseqüências sobre a Petrobras, as crescentes diferenças com o Congresso estão ameaçando prolongar o ajuste fiscal, dizem os economistas. Isso poderia, por sua vez atrasar uma recuperação - BNP Paribas no seu relatório intitulado "Vejo você em 2017" está prevendo que a economia vai encolher mais 0,5 por cento no próximo ano. 



"Hoje o Brasil está vivendo uma crise econômica? Sim ", diz Meirelles. "Mas a maior crise no Brasil não é essa. A maior crise no Brasil está em outro lugar. É um vácuo de liderança ". 



Para Dilma Rousseff, a estratégia será a de sobreviver ao próximo ano e além com a esperança de uma recuperação econômica. Já há sinais de que a política monetária restritiva do Banco Central está agindo para reduzir a inflação. Se isso puder ser trazido sob controle no próximo ano, o estrangulamento das altas taxas de juros podem começar a ser facilitado, permitindo a economia de respirar novamente.



A mesma esperança é compartilhada por executivos da MAN. Pode ser um pouco tarde demais, mas o Brasil está tentando fazer as coisas certas, diz Cortes. "Em 2016, a economia pode não se recuperar, mas ela vai começar a se recuperar e as coisas vão voltar ao normal em dois anos", argumenta ele. "Os fundamentos da economia são razoáveis. Não podemos comparar [o Brasil] com a Argentina, a Bolívia ou a Venezuela. "

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