Financial Times: Ameaça de rebaixamento do Brasil é um sinal de perigo real
Mercados dão de ombros para a notícia, mas os investidores não devem levar isto a sério.
Quando a Standard & Poor's disse nesta terça-feira que estava considerando downgrade do rating de crédito do Brasil em um nível para a categoria junk ou especulativo, os mercados pareciam não ligar para a notícia.
Inicialmente, depois de alcançar o valor mais baixo em 12 anos, a moeda do Brasil, o real, terminou a sua cotação praticamente estável em R$ 3,36 em relação ao dólar, enquanto o índice de ações de Ibovespa continuou crescendo como no início do dia, subindo 1,78% para 49,601.60 pontos. Os investidores não devem levar a sério, no entanto, a aparente indiferença dos mercados à notícia calamitosa que a duramente conquistada classificação de grau de investimento da maior economia da América Latina estava em perigo, dizem os analistas.
A resiliência dos mercados deveu-se mais aos especuladores e corretores fazendo carry trade, se aproveitando da moeda depreciada, eles dizem. A mensagem de longo prazo da decisão da S & P para revisão negativa sobre o rating BBB- é clara, a não ser que o Brasil faça algo radical, logo vai se juntar às fileiras dos outros países soberanos com classificação de junk, como a Rússia, a Turquia e a Indonésia.
"Estamos caminhando para grau de não-investimento, esta é a minha opinião", diz Ilan Goldfajn, economista-chefe do Itaú Unibanco.
Para o cauteloso ministro da Fazenda do Brasil, formado na Universidade de Chicago, Joaquim Levy, este é exatamente o tipo de resultado que ele procurava evitar.
Ele foi escolhido a dedo final do ano passado a partir de sua posição como chefe de gestor de fundos do setor privado, o Bradesco Asset Management, por Dilma Rousseff para sanear as finanças públicas do Brasil. As finanças do país estavam uma confusão após a presidente de esquerda tentar em seu primeiro mandato entre 2011 e 2014, compensar o fim do super-ciclo das commodities e o boom do crédito interno ao lançar um estímulo fiscal prolongado.
O ministro Levy inicialmente prometeu um superávit fiscal primário - o saldo orçamental após o pagamento de juros, considerado um indicador-chave da saúde das finanças públicas no Brasil - de 1,2 por cento este ano e de 2 por cento em 2016 e 2017. A ideia era ganhar de volta a confiança dos investidores através da disciplina fiscal.
O que ele não contava, no entanto, era que o aprofundamento da recessão no Brasil neste ano devastaria as receitas do governo. Muitos analistas estão agora prevendo que o crescimento do produto interno bruto este ano será negativo em 2 por cento ou mais. Para complicar ainda mais o quadro, a uma crise política crescente decorrente do escândalo de corrupção que se alastrou na companhia petrolífera estatal Petrobras dividiu o governo e ameaça parar o programa de austeridade fiscal.
"Nós vemos que atualmente existem sinais de diminuição da coesão política no Congresso que do nosso ponto de vista pode levar a possíveis resultados políticos ineficazes nos próximos meses", diz Lisa Schineller, analista soberana da S & P.
Para os mercados, isto tem significado um constante enfraquecimento do real este ano, juntamente com aumento das taxas de juro de referência e um mercado de ações instável.
Depois dos brasileiros terem retornado do carnaval em fevereiro, a Bovespa começou uma corrida de longo prazo na esperança de que os esforços de Levy dariam frutos. Mas após um pico em Maio, a extensão da desaceleração econômica no Brasil começou a tornar-se evidente, levando a um declínio feroz no índice, afirmam analistas.
O ceticismo do mercado sobre a capacidade do governo de cumprir suas metas orçamentárias foi confirmado quando o ministro Levy, na semana passada anunciou que estava reduzindo sua previsão para o superávit primário em 2015 para 0,15 por cento, também reduzindo-o fortemente para os próximos anos.
"A revisão da semana passada para as metas fiscais feitas por Levy foram maiores do que o esperado por isso, não estamos surpresos pela avaliação da S & P," diz Dan Senecal, diretor-gerente da Newfleet Asset Management, que tem US$ 12,4 bilhões em ativos sob gestão.
Ele diz que não vê a perda de grau de investimento como "uma conclusão precipitada". Mas (acredita que) "a probabilidade (da revisão para baixo) está crescendo e nós esperamos contínua pressão descendente da classificação de todas as principais agências de classificação, entre o final do ano de 2015 e primeiro trimestre em 2016".
Os analistas estão agora à espera da resposta de seus pares da S & P, Moody e Fitch. A classificação de Moody para o Brasil é Baa2, dois níveis acima de especulativo - junk, e Fitch tem o país em uma classificação BBB, equivalente. Fitch reduziu sua previsão de "estável" para "negativo" este ano e os economistas esperam que uma delas ou ambas em breve rebaixarão o Brasil um ponto para um degrau acima do status especulativo - junk, mantendo uma perspectiva negativa. Uma pesquisa recente da Reuters com 28 players do mercado na última terça-feira mostrou que a maioria acreditava que pelo menos uma agência de rating rebaixaria o Brasil para grau especulativo até o final do próximo ano.
A perda de grau de investimento forçaria a saída de ativos brasileiros por parte de um grande número de gestores de fundos de longo prazo que não são capazes de investir em títulos com classificação especulativa, diz Marcos Casarin de Oxford Economics, em Londres.
Sob este cenário, a moeda do país enfraqueceria rapidamente em relação ao dólar, talvez indo em direção à marca de R$ 4,00. No lado positivo, o sentimento de crise criado por este cenário surpreenderia os políticos forçando-os finalmente a agir para conter o défice orçamental e a considerar as reformas econômicas para restabelecer o crescimento.
"Este ano foi um ano de choque de realidade para o Brasil, mas eu ainda acho que 2016 será pior. Se o ajuste não vir este ano, ele virá no próximo ano ", diz ele. No entanto, ainda há um homem que está entre o Brasil e um possível rebaixamento: Joaquim Levy. Na terça-feira ele aparentava estar como sempre centrado e calmo, recusando-se a encarar o desafio pelo lado modo negativo, apesar da situação parecer cada vez mais desesperada para muitos dos seus antigos colegas dos mercados.
"O governo brasileiro reafirma seu compromisso de consolidação fiscal", disse uma nota do ministério da Fazenda.